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Autor Tópico: “As pessoas com deficiência têm o direito de recorrer a quem quiserem”  (Lida 2508 vezes)

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“As pessoas com deficiência têm o direito de recorrer a quem quiserem”


BEATRIZ DIAS COELHO
17/03/2019 12:06

A psicóloga Raquel Pereira tem vindo a investigara sexualidade das pessoas com deficiência. Em entrevista ao i, lamenta que estas pessoas continuem a ser “mais insatisfeitas” e tenham “mais dificuldades” tanto nos afetos como no sexo

Raquel Pereira tem 27 anos e integra a equipa do SexLab - Laboratório de Investigação em Sexualidade Humana da Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade do Porto. No âmbito do doutoramento, desenvolveu um estudo inédito por cá, debruçado sobre as crenças das pessoas com diversidade funcional quanto à sexualidade, às suas experiências e às mudanças necessárias para, como qualquer pessoa, poderem experienciar o sexo. O tema, garante a especialista, continua a ser um tabu e o país está atrasado: falta informação sobre como experienciar a sexualidade caso a caso, formação de profissionais que possam prestar acompanhamento e há quem defenda até a criação da figura de assistente sexual. “A assistência sexual é muito importante porque é a única forma que muitas pessoas têm de aceder ao seu corpo, de perceberem como é que se podem tocar e que tipo de sensações é que despoletam e como”, diz ao i. A especialista assinala que muitos médicos desvalorizam a vivência sexual das pessoas com diversidade funcional, garantindo que “são pessoas como todas as outras e têm necessidade de viver a sua sexualidade, os seus afetos e as suas relações de uma forma plena”.

 

As pessoas com deficiência, como quaisquer outras, também fazem sexo. Isso ainda é um tabu?

Sim, essa é a perceção que tenho quer do contacto com as pessoas que tenho tido ao longo dos quatro anos em que tenho vindo a trabalhar neste tema, quer também pela investigação e pelas revisões literárias que vou fazendo. No entanto, há alguns avanços. Nota-se muito até por ter cada vez mais contactos de meios de comunicação e de instituições que querem falar do tema. Além disso, as próprias pessoas com deficiência têm cada vez mais voz e expressam a sua necessidade de se abordar o tema e de o incluir nos seus cuidados de saúde, na sua vida de uma forma geral. Ainda assim, estamos numa fase muito de desmistificar, de um primeiro contacto, de começar a partir pedra e dizer que não se trata de pessoas que não têm qualquer tipo de necessidade, muito pelo contrário, são pessoas como todas as outras e têm necessidade de viver a sua sexualidade, os seus afetos e as suas relações de uma forma plena.

Tem feito investigação sobre a sexualidade na deficiência.
Porquê esta temática?

Estou a estudar este assunto no âmbito do meu projeto de doutoramento que começou há quatro anos. Sou psicóloga de formação e fiz o mestrado em psicologia clínica no âmbito da equipa do Sex Lab, onde depois me mantive a trabalhar e apostei nesta temática em específico. Não me interessava fazer investigação só por investigação, interessava-me fazer investigação que tivesse algum impacto social relevante. Esta temática já se começava a abordar um pouco na altura, começaram a surgir alguns movimentos ativistas cá, nomeadamente o Sim, Nós Fodemos, e isso chamou-me à atenção. Percebi que seria algo do meu interesse, e ainda era um assunto pouco estudado, sobretudo no âmbito nacional.

O que concluiu da investigação com estas pessoas? Não são certamente assexuais…

Não. O meu estudo é um estudo misto, porque quisemos não só investigar algumas variáveis que nos pareciam relevantes do ponto de vista mais biopsicossocial, mas também queríamos incluir a voz das pessoas, ou seja, o que elas próprias tinham a dizer, e foi por aí que iniciámos. Tive a oportunidade de fazer grupos focais com 26 pessoas com diversos tipos de incapacidade a nível físico, com esclerose múltipla, amputações, etc., divididas em quatro grupos, e nesse estudo concluí várias coisas. Uma delas é que de facto elas reconhecem a sua sexualidade e afetividade como direitos importantes que fazem parte de uma vida independente, de uma forma geral todas elas foram dizendo que acham que o assunto deve ser incluído na agenda social, que deve ser tido em conta em termos de políticas de saúde e de cuidados de saúde. Percebi que para algumas a questão da assistência sexual, por exemplo, é de facto uma resposta viável e válida e talvez a única para terem acesso ao seu corpo, mas a outras não lhes interessa tanto, interessa-lhes mais a possibilidade de estabelecerem relacionamentos afetivos, íntimos, ter um parceiro ou uma parceira. Quanto à forma como esta questão está presente nos cuidados que vão tendo, dizem que aí ainda há muito a fazer, sentem que há muita necessidade de aceder a informação específica sobre como é que as suas doenças têm impacto na saúde sexual, como é que por exemplo uma lesão vai ter impacto.

Mas imagino que haja médicos a abordar o assunto.

Embora a questão já vá surgindo por parte dos profissionais de saúde, é muito variável: algumas pessoas diziam que os médicos ou outros profissionais de saúde lhes perguntam por essa área da vida delas, outras diziam que isso não acontecia de todo. Algumas falavam mesmo sobre como, quando elas próprias perguntavam, sentiam da parte dos profissionais de saúde um certo desconforto ou que essa necessidade nem sequer era importante nem uma prioridade.

Mas a investigação tem também uma vertente online, não é?

Sim, depois dos grupos focais fizemos um estudo online e chegámos a uma maior amostra de pessoas com e sem incapacidade. Recolhi testemunhos de 189 pessoas com diferentes incapacidades, sobretudo deficiências a nível motor e muscular, muito semelhantes às da amostra que recolhi nos grupos de focais – amputações, esclerose múltipla e ainda lesão cerebral – AVC e traumatismos crânio encefálicos, com o mínimo de capacidades cognitivas preservadas para que os participantes pudessem preencher os questionários autonomamente. Esta investigação online, que estamos agora a analisar, focou-se nalguns fatores mais psicológicos que podem ajudar a manter ou a melhorar alguns aspetos do funcionamento da relação sexual e da satisfação sexual. Os dados ainda vão sair, mas posso adiantar alguns: algumas pessoas, por exemplo, tomam a iniciativa de perguntar [as dúvidas ao médico], no ato sexual levam para a brincadeira determinadas dificuldades, etc..

Porquê incluir pessoas sem diversidade funcional?

Quisemos incluir todas essas pessoas e perceber, mais do que as diferenças entre elas, como é que diferentes pessoas, tendo ou não incapacidade, viviam a sua sexualidade.

E que diferenças existem então
entre a sexualidade de pessoas com deficiência e de pessoas sem deficiência?

O meu estudo, como outros, acaba por reforçar a ideia de que pessoas com incapacidade são mais insatisfeitas ou têm mais dificuldades, mas depois na prática clínica e no contacto com as pessoas vemos que não é necessariamente assim, há muitas outras diferenças além do facto de terem ou não uma incapacidade e portanto o interesse foi também superar esse viés que costumamos ter de comparar necessariamente pela incapacidade. Quisemos mesmo perceber pelo lado das características psicológicas como é que elas se diferenciam, independentemente da incapacidade.

E na prática, de que forma é a sexualidade das pessoas com deficiência diferente?

Baseando-me nos relatos que tive, é natural que devido a algumas questões da incapacidade e efeitos da medicação, fadiga, haja questões que são diferentes, mas isso é também algo inspirador e que pode ser útil para todas as pessoas. Muitas vezes a sexualidade foca-se muito na genitalidade e estas pessoas são confrontadas com terem de criar alternativas à interação mais centrada na genitalidade. A nível da atividade sexual em específico, as diferenças podem passar por as pessoas com deficiência terem algum tipo de ajuda a nível de mobiliário ou de algum instrumento de apoio, como elevadores para colocá-las na cama ou almofadas para as ajudar com alguns movimentos ou até com a postura.

Estas pessoas têm uma maior dificuldade em criar ligações afetivas?

Sim. Mas aqui há uma diferença relevante, entre pessoas que adquiriram uma determinada doença ou lesão numa fase da vida já mais tardia, por exemplo na idade adulta, ou pessoas que nasceram com algo congénito ou que o adquiriram ainda muito precocemente, na infância por exemplo. As pessoas que desenvolveram a incapacidade mais tardiamente, muitas das vezes já têm relacionamentos e vão mantendo-os e isso até é um fator que facilita a abordagem da sexualidade por parte dos profissionais de saúde, porque vão antecipar que aquele casal quererá manter o contacto sexual e a relação a nível afetivo e íntimo e percebi no estudo que com essas pessoas a pergunta era mais facilmente feita. Elas passam mais é por uma vivência de luto e um ajustamento face às novas condições físicas e às limitações que poderão vir a surgir.

E no caso das pessoas que nasceram
 já com alguma incapacidade?

As pessoas que nasceram com incapacidade ou que a adquiriram precocemente, sofrem mais este tipo de preconceito face aos tabus e ao mito de que são provavelmente assexuais. E isso faz com que tenham um desenvolvimento psicossexual diferente dos pares que não têm nenhum tipo de deficiência ou incapacidade.

Ou seja, isso leva mesmo a um desenvolvimento psicológico diferente?

Sim. Pensam que às tantas, ao chegarem à fase adulta, não vão desenvolver necessidades sexuais, não têm uma educação sexual e portanto acabam por ter um desenvolvimento psicossexual diferente dos seus pares que não têm nenhum tipo de deficiência ou incapacidade. Não generalizaria a todos, mas acaba por se verificar mais essa tendência.

Existe algum tipo de apoio do Estado, através por exemplo da Segurança Social, ao nível de educação sexual ou até de assistência, que mencionou, para estas pessoas?

Não estou muito dentro desse âmbito, mas posso falar em termos das perceções que fui recolhendo. Em termos de reabilitação, por exemplo, existem alguns serviços mais ou menos especializados, como o centro de reabilitação de Alcoitão, que tem uma consulta de especialidade. Alguns profissionais de saúde e algumas equipas vão abordando essa questão conforme ela vai surgindo, se as necessidades forem colocadas pelos pacientes são capazes até de articular diferentes respostas, agora, o que parece haver é uma grande variabilidade nestas questões e parte muito também da iniciativa das próprias pessoas de colocarem as perguntas, não se pode dizer que essa questão está realmente incluída nos cuidados e que parta dos profissionais abordá-la.

Comparativamente com outros países, estamos atrasados nesta matéria?

Com base nas pesquisas que fui fazendo e numa experiência que tive há pouco tempo, de formação num centro de reabilitação na Holanda, de uma forma geral, por cá está-se agora a começar e as discussões que estão a surgir tardiamente face a outros países. Estamos atrasados também na questão da assistência sexual em relação a países como a Holanda ou a Dinamarca – cá ainda não existe esta figura da assistente sexual ou do assistente sexual – e em termos de reabilitação, falta, lá está, incluir a sexualidade nos cuidados prestados pelas equipas multidisciplinares. Isto não pode ser só uma questão dos especialistas, dos sexólogos mais especializados, é algo que pode ser abordado por qualquer profissional numa equipa multidisciplinar. Às vezes as dúvidas que as pessoas com incapacidade têm são muito simples, nem sequer são problemas muito complicados de resolver, tem que ver mais com falta de informação e a verdade é que só uma pequena parte dos pacientes é que irá precisar mesmo de uma terapia intensiva e mais especializada a nível sexual. Na Holanda tive a oportunidade de perceber que já existe um conjunto de profissionais, neste caso sexólogos, a trabalhar exclusivamente na reabilitação sexual, que está nos centros de reabilitação e presta cuidados aos pacientes, em particular na questão da terapia sexual.

Tem referido o conceito de assistência sexual. Que conceito é este e o que se esperará de um assistente sexual?

Há muitas pessoas que criticam esta noção de assistente sexual dizendo que talvez seja um termo politicamente correto para falar de prostituto o u prostituta. E aqui nós não queremos passar uma ideia de que é moralmente incorreto recorrer ao prostituto ou à prostituta, não nos cabe a nós dizer isso, ou seja, as pessoas com incapacidade ou deficiência têm todo o direito a recorrer a quem quiserem e não vamos nós julgar isso. Mas quanto aos assistentes sexuais a sua especificidade passa pela formação que poderão receber para lidar com os aspetos mais médicos ou do serviço a alguém que está por exemplo numa cadeira de rodas, que tem por exemplo um tubo, alguma característica mais específica da sua mobilidade ou incapacidade.

Com a qual o prostituto ou prostituta não saberiam lidar.

Exato. Portanto, a assistência sexual passa por garantir que há profissionais preparados para lidar com estas pessoas que facilitarão o acesso à vivência da sexualidade, porque estão preparados para lidar com esses aspetos da vida das pessoas. De resto, a assistência sexual é muito importante porque é a única forma que muitas pessoas têm de aceder ao seu corpo, de perceberem como é que se podem tocar e que tipo de sensações é que despoletam e como.

Na semana passada, no Eros Porto, foi uma das especialistas convidadas para debater o tema da sexualidade das pessoas com deficiência. Como vê o interesse de um salão erótico pelo assunto?

Comecei por ficar surpreendida, mas também muito contente por perceber que isto significa um grande avanço na forma como as pessoas entendem e estão disponíveis para incluir outros cidadãos na temática da sexualidade na deficiência e na questão do prazer e do acesso ao prazer. Motivou-me perceber que desta forma poderia mesmo chegar ao público em geral sendo que quer pessoas em cadeira de rodas, quer pessoas com outros tipos de incapacidade frequentam também o salão. É muito bom perceber que parte mesmo das pessoas com e sem incapacidade o interesse por estas temáticas. O debate correu bem e para mim um dos aspetos mais positivos foi mesmo a assistência, que foi bastante razoável. Uma grande parte era até pessoas que, pelo menos visivelmente, não pareciam ter nenhum tipo de dificuldade a nível motor e de mobilidade mas que estavam muito interessadas na temática.

Mesmo para as pessoas com deficiência a sua própria sexualidade é um tabu?

Sim, e é por isso que para elas iniciativas como esta têm um enorme impacto. Só o falar, o fazer um evento dedicado ao tema tem um grande significado e um poder enorme de desmistificar um pouco o assunto e de lhes dar outras perspetivas.


Jornal I
 
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