Pessoas Extraordinárias!
A 3 de Dezembro (Sábado) comemora-se o Dia Mundial do Deficiente – uma realidade que continua pouco visível na sociedade portuguesa. Para mudar mentalidades, há uma rotunda em Albufeira que vai ganhar uma peça de arte pública, iniciativa de uma associação do Algarve. E em Portimão, há um atleta de natação que tem ganho prémios em praticamente todas as competições que participa. Conheça estas histórias de pessoas extraordinárias!
|MoreEdição 706 ( 1 Dez 2011), Sem Comentários »
São cerca de 500 azulejos pintados à mão. Vêm de várias instituições e escolas portuguesas, para tornar a vulgar rotunda da Balaia, em Albufeira, num local especial. “A ideia é dar a conhecer a toda a população algarvia e a nível nacional, que os deficientes têm um grande potencial. Fazem trabalhos tal e qual as pessoas ditas normais.
Apesar da sua incapacidade, são úteis”, explica Nuno Neto, 50 anos, empresário, que em 2003 fundou a Associação de Apoio à Pessoa Excepcional do Algarve (APEXA).
Dispostos num conjunto de muros com três metros de altura, os azulejos foram todos feitos por deficientes. “Não havendo estas coisas, as pessoas esquecem-se porque não vêem, porque não sentem o problema da deficiência. Eu próprio admito que antes, havia muita coisa que me passava ao lado”, diz Nuno Neto, que despertou para esta realidade na própria família.
“Tive a infelicidade ou a sorte de ter um filho com espinha bífida. Então, pensei que tinha de arranjar bases para ele ter uma estrutura de apoio no futuro, e que também pudesse chegar a outros. Portanto, esta associação será um segundo pai para ele poder subir na vida, na medida das suas possibilidades.
Juntei-me a um grupo de pais e amigos, falei com os autarcas e seguimos em frente”, conta.
Actualmente, a APEXA soma 300 associados do Algarve todo, a maioria do concelho de Albufeira, de todas as idades. O arranque foi difícil, e o maior problema continua a ser o funcionamento das várias valências em vários “espaços emprestados”. Outra dificuldade, segundo Nuno Neto, é a morosidade e o peso da burocracia institucional.
Ainda assim, esta instituição disponibiliza vários serviços à comunidade, como a intervenção precoce (dos 0 aos 6 anos, com 30 utentes). Na Oura, dinamiza um projecto socioprofissional e outro de combate ao insucesso escolar nas Ferreiras, ambos “com grande êxito”. Outra aposta de sucesso é o atelier de artes, no Algoz.
Nuno Neto diz que ainda há mesmo muito para fazer. “Não tenho dúvida que se estivesse em Lisboa, Porto ou Coimbra tudo seria diferente, porque nesta área da deficiência, está tudo centralizado. Aqui, os recursos ainda são fracos. Mas felizmente, os nossos empresários e a sociedade civil gostam de apoiar estas causas e é isso que nos tem valido. Ainda há dias, tivemos dois casais holandeses que nos quiseram ajudar e compraram €2000 em material de fisioterapia para as crianças da intervenção precoce”.
Também é preciso mudança de mentalidades. “Sim. Sou do tempo em que não havia um deficiente nas escolas. Eram mesmo postos de lado e não havia hipótese. Agora, não. Há uma estratégia educativa de integração nas escolas. E isso faz com que no futuro, as coisas sejam diferentes. Mas vai ser preciso uma geração, não tenho dúvidas”, diz.
“Eu sentia muita dificuldade quando percebia que toda a gente olhava para mim pelo simples facto de levar um deficiente numa cadeira. Tive de começar a desligar. Hoje, já não sou capaz de o deixar em casa. É um prazer. Claro que no início, isto é muito doloroso. Às vezes, estamos num sítio qualquer e ouvimos as pessoas dizerem coitadinho. Ainda estamos nesta fase. É a nossa cultura”, lamenta.
O mural foi um desafio lançado no final de 2010. Para agitar consciências, a APEXA organiza também o concurso nacional «Reabilitar através da arte» – fotografia, pintura e escultura. Este ano, há 42 instituições a participar e 95 trabalhos – 15 serão premiados. “Pedimos aos hotéis do Algarve para oferecerem fins-de-semana. Estão todos de parabéns, porque apesar dos tempos difíceis, estão todos a colaborar muito com a área social.”
“Admito que apesar de tudo, esta também tem sido uma experiência muito enriquecedora. Estas pessoas são mesmo excepcionais, diferentes e iguais” a todas as outras.
Filipe Santos – um campeão a apoiar
Paulo Alexandre, 39 anos, é técnico de natação da autarquia de Portimão. É um dos fundadores da associação «O2», cujo objectivo é trabalhar com a deficiência e também com um público mais diverso.
Desde 2005 que treina voluntariamente, várias horas por dia, Filipe Santos, um jovem de 23 anos, portador de trissomia 21. “Percebi que ele aprendia facilmente, e tem sido um processo natural”, conta.
Recordista Nacional de 25, 50, 100, 200, 400 metros livres e recordista nacional de 100 e 200 metros mariposa, Filipe Bjorke dos Santos tem o sonho de continuar a nadar. A sua última conquista foi a Medalha de Ouro nos 200 metros mariposa no Campeonato da Europa 2011.
Segundo o treinador, este atleta “entende bem a importância das competições, e quer sempre ganhar”. O problema é que neste momento, apesar do grande potencial, “não tem qualquer patrocínio a nível de verbas”.
Paulo Alexandre estima que cada participação, no território nacional, tem um custo mínimo de 500 euros, para cobrir com viagens, alojamento e equipamentos”. Actualmente, a dupla tem por objectivo o mundial de 2012, a disputar em Itália.
“Fui sonhando e fui levando o Filipe a subir degraus. Ele foi para o topo do mundo, actualmente é o melhor da Europa. Mas para atingirmos um pódio em 2012, temos que ir para o ginásio, envolve um trabalho mais profissional”.
“Ele era gordo e evoluiu muito, também a nível social. Comecei a pôr o Filipe a correr, e depois de quase um ano de treinos na praia, lembrei-me de o levar ao campeonato nacional de atletismo, onde ganhou a medalha de bronze nos 200 metros”, diz.
“O desporto para deficientes não é muito valorizado. E no Algarve, isso é notório, embora haja todas as condições para isso. Repare, eu tive um miúdo autista, o Rui, que treinei e é o melhor nos 25 metros de costas em Portugal. Agora, está parado”, lamenta.
“Há preconceitos e muita ignorância. A ideia é que são coitadinhos, doentes, anormais. Eles não são nada disso. São deficientes e ganham competições porque trabalham”.
“Tive um miúdo, o Gustavo, que ninguém o aceitava e eu pu-lo a nadar. Há dificuldades acrescidas no processo, mas eu estou disposto a isso. E claro, tudo depende da deficiência e do grau de deficiência. Temos que nos informar e a partir daí, tudo é possível”, garante.
O Centro Comercial Continente de Portimão resolveu apoiar esta dupla. De 1 a 4 de Dezembro, vai haver uma venda beneficente, que decorrerá no Piso -1, e cujas receitas revertem para o atleta. Este apoio é fundamental para a sua participação no Mundial de Itália 2012.
Fonte:
http://www.algarve123.com