“Precisamos de um Estado que dá autonomia”. Marcha por uma Vida Independente desce Avenida da Liberdade03 de maio 2025 - 19:28
Manifestação aconteceu em vários pontos do país. Em Lisboa, manifestantes criticam avanços lentos e direitos que não saem do papel, e pedem "grandes lutas".
“É o dia da vida independente e uma marcha importante para todos nós, para conseguirmos a nossa autonomia”, diz Lúcia Paulino, sócia do Centro para a Vida Independente. Em frente ao Tivoli, na Avenida da Liberdade, em Lisboa, junta-se mais de uma centena de pessoas para participar na marcha, que acontece todos os anos.
Lúcia considera que nos últimos anos os avanços têm vindo a passo de caracol. “São passos muito pequenos e os avanços têm de ser feitos através de grandes lutas”, sublinha. Entre os grandes avanços está o projeto-piloto da assistência pessoal, aprovado em 2019. Apesar de estar disponível “a uma minoria” e de haver muita gente à espera, Lúcia considera ser um passo na direção certa.
Mas por fazer fica o alargamento dessa assistência pessoal, o combate às barreiras arquitetónicas e uma maior acessibilidade aos transportes. “Há muito por fazer, muito mesmo”, conclui. Entre os aguaceiros, os manifestantes aguardam o início da marcha em direção ao Rossio. Quando a chuva dá tréguas, ocupa-se uma das faixas da Avenida da Liberdade.
Uma das pessoa que ocupa a avenida é Ana Santos, assistente pessoal que veio desde o Bombarral participar na manifestação. “Estou nesta marcha devido à falta de respeito que há para com estas pessoas”, lamenta. “O que eu pedia é que o nosso Governo olhasse para estas pessoas e que elas não se tornassem um peso a mais. Estas pessoas não são um peso, são como todas as outras”.
Também esta assistente pessoal considera que os avanços têm sido demasiado lentos, “porque há muita gente na escuridão ainda”. Diogo Martins, também do Centro para a Vida Independente, concorda. “Há uma série de direitos que nós temos na legislação mas que não temos na prática, e nós queremos ver esses direitos reconhecidos e implementados”, diz.

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É um trabalho de longo curso, mas a manifestação é necessária porque “é preciso mostrar às pessoas que ainda há coisas que precisam de ser implementadas”, sublinha Diogo. “Queremos que se compreenda que todos estes avanços têm de ser de forma estrutural”.
Uma das principais reivindicações do movimento é habitação acessível e o membro do Centro para a Vida Independente frisa que “somos pessoas com menos rendimentos da população ativa em Portugal e somos obrigados a comprar as habitações mais caras” devido às condições de acessibilidade. “Estamos a ser discriminados e não há mecanismos de apoio”.
“Ou temos de ser extremamente pobres, sem ter rendimento, para ter direito a uma habitação acessível, ou então temos de ter imenso dinheiro para conseguir ter uma habitação com condições de acessibilidade. Tudo o que está no meio não existe”, diz Diogo.
O apelo lançado à manifestação fala também no combate à institucionalização de pessoas com diversidade funcional. Em Portugal, isso está ligado às situações em que os familiares não têm capacidade de assegurar condições a essas pessoas. “A única resposta que o Estado tem é mandar-nos para essas instituições”, explica. “E as instituições têm problemas, independentemente da sua qualidade. O próprio paradigma tem muito a ver com tirar-nos liberdade”.
Por esta altura já os manifestantes chegam ao Rossio, entre cânticos de “O que é que nós queremos? / Vida independente / Quando é que nós queremos? / Já, já, já”. Naquela praça se concentram as pessoas que, apesar da chuva, trocam conversas de mais um Dia Europeu da Vida Independente assinalado.colocar relacionado
“Precisamos de um Estado que inclui”
A coordenadora do Bloco de Esquerda esteve presente na manifestação, em solidariedade e para sublinhar a importância das reivindicações da Marcha pela Vida Independente. Mariana Mortágua encontrou-se com o ex-deputado do Bloco de Esquerda, Jorge Falcato, lembrando o seu contributo nesta matéria a nível nacional.
“Há muitos anos, quando elegemos o Jorge Falcato, conseguimos iniciar um processo legislativo. Queremos que seja também também um processo de alteração de mentalidades, da forma como olhamos para as pessoas com deficiência”, disse a dirigente bloquista.

Fotografia de Rafael Medeiros.
No centro desse novo paradigma “está a autonomia” e o “direito a decidir”, segundo Mariana Mortágua. “Estamos a falar de barreiras urbanas, mas isso é a ponta do icebergue. Um dos maiores problemas é a falta de capacidade do Estado para dar condições para que estas pessoas se autonomizem”, explicou a coordenadora do Bloco de Esquerda. “Isso faz com que haja uma parte da população que é inferiorizada e tratada como se não tivesse autonomia, privada de uma vida autónoma”.
A dirigente bloquista lembrou o projeto-piloto dos assistentes pessoais, mas lamenta que o projeto tenha acabado e que o Governo não tenha dado resposta. “Precisamos de um Estado que inclui, que dá independência e autonomia, e é para aí que queremos caminhar”, rematou.
Fonte: ESQUERDA